30 de abr. de 2010

corporeidade



O que é corporeidade?
É o corpo invadido pelo pensamento e pela emotividade.
Por ela expressamos a vida nas suas dimensões física, psíquica e espiritual.
Em minha corporeidade feminina
sinto-me
um vaso de barro que contém moedas de ouro;
bloco de mármore
lapidado ao longo de mais de cinco décadas;
arca de emoções diversas;
templo que aninhou dois filhos
cujas escadarias já tinham sido lavadas no batismo.
Dizem que não há amor sem corporeidade.
Por ela eu toco a vida e a vida me toca.
Olho no espelho e
celebro os mementos das lutas vividas.
Em meu corpo minha alma não se aprisiona,
mas encontra abrigo e guarida.
Em meu pé direito a flor de cerejeira
marca a perenidade da relação com minha filha.
Isto é corporeidade...

Sísifo

Sísifo fora condenado, por Zeus, a incessantemente rolar uma pedra até o topo de uma montanha e quando já estava alcançando, a pedra rolava novamente montanha abaixo até o ponto de partida e aí Sísifo tinha que retornar e iniciar tudo novamente... Os deuses sabiam que não havia nada mais terrível do que o trabalho inútil e sem esperança.

Pense nisso...deve haver um sentido para o trabalho de subir a pedra, tantas vezes quanto for necessário, de modo que não nos sintamos inúteis e nem vejamos a vida como um absurdo.

JUVENAL ARDUINI

Gosto muito das obras do antropólogo uberabense, JUVENAL ARDUINI. Recomendo aos meus alunos a leitura dos seus livros, mas principalmente o último, Antropologia: ousar para reinventar a humanidade. Vejam, a seguir, a resenha de André Azevedo:

A rebelião antropológica proposta por Juvenal Arduini é uma reação à sociedade de massa que reproduz cópias, multiplica o modelo predominante, enquadra idéias, gestos e costumes. O autor chama de "clonagem sociológica" o fenômeno de auto-reprodução contínua dessa padronização cultural. Ele afirma que há inesgotável potencialidade para a humanidade tornar-se emancipada, autônoma; mas a pedagogia da submissão imobiliza a revolta autêntica. Arduini argumenta que é necessário resgatar o sentido positivo dos termos "insubissão" e "re-volta" – enviar de volta o que é devido, devolver, restituir a dignidade usurpada –; termos que foram estigmatizados pela mentalidade conservadora.
Arduini afirma que um comportamento adesista empobreceu o pensamento contemporâneo. "As pessoas aderem apressadamente a idéias, sistemas políticos, expressões culturais e credos religiosos", escreve. Essa adesão é incentivada pela sedução da publicidade maciça, de forma que "as pessoas incorporam atitudes introjetadas como se fossem decisões de sua própria vontade". A "adesão" é confrontada com o termo "opção". Ao aderir, o ser humano é conduzido por um modelo exterior; mas ao optar o homem afirma-se, assume responsa-bilidade intelectual, responde por seus passos e por suas conseqüências.
A precisão em que o autor analisa os conceitos é justa-mente um dos pra-zeres mais estimulantes na leitura do livro. Arduini tem a habilidade de erguer as palavras, desnudá-la, examiná-la exaustivamente e trazer de volta o significado autêntico do termo. Esse processo - chamado hermenêutica, ou "a arte de interpretar" - ele desenvolve sobretudo através da contraposição de conceitos que, por causa da distração do leitor, antes não pareciam opostos. O texto de apresentação da obra não exagera quando anuncia a "constelação de temas" que Arduini rege no livro. Através de referências à mitologia, filosofia e antropologia, o autor ilumina dimensões do raciocínio que normalmente encontravam-se escondidas na sombra do senso comum.
Um exemplo é a discussão sobre o problema da "diferença". Para ele, a diferença não é anormalidade nem distorção, mas originalidade que distingue personalidades. O autor escreve que há dois modos de interpretar os seres humanos: através do que possuem em comum e pelo que diferenciam. "Na primeira visão, os homens aparecem como repetidos. Na segunda visão, cada pessoa caracteriza-se por alguma singularidade. É o confronto entre a indiferença e diferença". De fato, o que é comum nos é indiferente. Somos naturalmente indiferentes às estatísticas que representam a miséria no país, por exemplo. A valorização da diferença impediria que a indiferença reduzisse os homens a coisas. "Ativar a diferença legítima entre pessoas, nações e culturas é avanço histórico da humanidade. (...) A indiferença tende a cancelar a diferença que incomoda", escreve. Saber conviver com as diferenças, portanto, é sinal de maturidade.
Arduini contesta valores engessados que tornam-se dogmas. Cita Jurgen Habermas, que analisa o dogma-tismo como incapa-cidade de auto-reflexão. "O dogmatismo é utilizado para sufocar o surto emancipatório e impedir a discordância", escreve. Ele refuta, por exemplo, a "paz" que amacia a exploração para torná-la tolerável. "A verdadeira paz gera a coesão orgânica da humanidade. (...) A pseudopaz mascara a realidade". Por pseudopaz, entende aquela paz que anestesia consciências para imobilizar os revoltados. "É moralismo vazio prometer paz aos que nada têm para sobreviver. Há momentos em que protestar é paz, e silenciar é antipaz." Para ele, paz não é sossego, concordismo ou cumplicidade. "Paz requer bravura". (André Azevedo)