14 de jun. de 2010

Como nos relacionamos com a temporalidade na nossa vida?



Fernanda Utumi (aluna do 2º período de Psicologia - UFU)

Como nos relacionamos com a temporalidade na nossa vida?

A percepção do tempo está presente em todos nós, independente de época ou cultura. Pretendo discutir como nos relacionamos com ele e como o significamos. Segundo Piettre (Apud BITTENCOURT, 2005, p. 4) o “tempo é conseqüência da marcha inacabada do espírito que anima o mundo” e para Bittencourt (2005, p. 3) “Na perspectiva existencial, o tempo é o horizonte da compreensão do ser.” O tempo segue paralelo às nossas vidas, não é algo concreto, uma coisa em si, mas é quase indissociável de nós. Creio que o tempo está mais para um suceder de tudo mesmo. É muito importante na construção do significado das nossas vidas. As vezes é figura, as vezes fundo. É como uma base para significar os acontecimentos, para entendermos os caminhos que as coisas percorrem para serem algo. É uma base para se ter noção do que já foi, do que é e do que pode ser.

Começamos a ter noção do tempo a partir do momento em que percebemos que as coisas passaram na nossa vida, que o tempo passou, que está passando e continuará a passar, o percebemos porque percebemos que o que era já não é mais. Isso gera uma noção de temporalidade, de seqüência e continuidade. Bittencourt (2005, p. 4) diz que para o indivíduo, no conceito de horizonte existencial existe a interpenetração do passado, presente e futuro. Com relação ao futuro fica uma ambigüidade angustiante, o futuro está por vir, os sonhos e projetos podem se realizar, ou seja, existe a possibilidade ser feliz, porém é o momento que mais se aproxima da morte. Ainda diz que “a esperança, fundada no vigor de ter sido, é a possibilidade de admitir novas saídas para o vivido, agindo na direção de outras possibilidades.”

A noção do tempo como algo que faz deteriorar está mais ligada à nossa finitude e à finitude das coisas, é uma característica nossa e não própria do tempo em si. A religiosidade parece ser uma forma bastante comum de explicar e de consolar o fim inevitável. Existem muitos mitos do qual o tempo é abordado. Vários organizam a vida em ciclos que vão da vida à morte e à vida novamente. Esse ciclo pode ter a função de superar a morte e todo e medo e angústia derivados dela. O teólogo e filósofo alemão Rudolf Otto (Apud RAMOS, 2002, p. 115) fala sobre o numinoso - sentimento único de integração e comunhão com o universo - vivido na experiência religiosa como algo que dá sentido à vida e à morte.

Sobre a dimensão objetiva do tempo e o impacto em nós

O tempo possui duas dimensões: uma como tempo objetivo, o cronológico (Kronos) e o tempo subjetivo (kairós). No âmbito objetivo, o tempo esta relacionado principalmente com as relações de trabalho, produção, lucro (tempo é dinheiro) e também com diversão (aproveite a vida). Nessa perspectiva, o tempo é como um relógio correndo depressa, na qual é preciso aproveitá-lo com o máximo de atividades possíveis, fazendo com que cada minuto seja “usado” ou “aproveitado”. A evolução tecnológica e científica também tem uma relação próxima com a temporalidade: muitos desses avanços são uma tentativa de fazer o tempo “andar mais devagar”, evitar os sinais do tempo, prolongar a vida. O interessante é o contraste dessa relação, por um lado o tempo, impassível, e por outro nós, armados de toda tecnologia existente contra os seus danos.

Acredito ser muito importante o interesse em aperfeiçoar as técnicas de ação sobre o mundo, significa também avanço no conhecimento. O problemas está nas concepções objetivantes do tempo. Nosso estilo de vida não estimula a compreensão do sentido da vida, somos a todo tempo orientados a produzir e produzir, mas o que acontecerá quando não produzirmos mais? “A chave para a questão da morte abre a porta da vida.” (KÜBLER- ROSS, 1975 APUD PAPALIA, OLDS & FELDMAN, 2006, p. 739)

A vida quando pensada com algo que a dê sentido, seja qual for a explicação, se torna mais tranqüila, aceitamos que o fim faça parte de algo que não entendemos, e que nele tem um motivo. Assim passamos a aceitar mais e viver com mais intensidade, com mais compreensão e menos vazio e desespero.

REFERÊNCIAS

BITTENCOURT, Maria Inês Garcia de Freitas. Reflexões sobre o tempo: instrumentos para uma viagem pelo ciclo vital. Psychê, São Paulo, v. , n. , p.93-104, jun. 2005. Disponível em: . Acesso em: 16 abr. 2010.

DAMASCENO, Alexandre Vinícius Campos, GOMES, Roseane Côrrea. Na medida certa. Departamento de Matemática, Ananindeua, Belém, PA. Disponível em:

PAPALIA, Diane E.; OLDS, Sally Wendkos; FELDMAN, Ruth Duskin. Desenvolvimento Humano. 8ªed São Paulo: Artmed, 2006.

RAMOS, Luís Marcelo Alves. Apontamentos sobre a psicologia analítica de Carl Gustav Jung. Educação Temática Digital, Campinas, v.4, n.1 –, 2002. 110-144 p.

O milagre de Anne Sullivan


Marco Aurélio Silva Esteves (aluno do 2º período de Psicologia-UFU)


O filme relata um caso verídico que se passa no sul dos Estados Unidos no qual uma professora, Anne Sullivan, que se dispõe a ensinar uma criança de sete anos, Helen Keller, que é cega e surda, e por estes motivos também poderia se decretar sua mudes, já que não poderia ouvir as palavras e nem ver os movimentos labiais realizados para pronunciá-las.

Helen já estava com sete anos quando Anne foi para sua casa educá-la e até então não sabia comer com talheres, se higienizar, entre outros comportamentos. Com isso podemos observar que no seu repertório ainda não havia comportamentos ou habilidades sociais que ao longo da história de vida em sociedade, pelos seres humanos, foram edificados como sendo essenciais para considerar o animal homem como ser humano. Além disso, o filme nos mostra o quanto somos dependentes de outros seres para construirmos nossa própria subjetividade, nossa personalidade, para sermos quem somos, e o quanto o ser humano é um “animal domesticável”. Pois, neste caso a criança foi educada por um ser humano e por isto aprendeu nossos costumes, nossas regras sociais, o que para nós é higiênico ou não, o que é aceitável ou não, mas poderia ter sido abandonada e acolhida por outro animal como um macaco, assim sendo aprenderia os costumes deste animal e não os nossos. Nós não nascemos prontos, vamos nos construindo e sendo construídos através de relações,entretanto, possivelmente também não morreremos prontos... Visto que a sociedade também muda e tem novas exigências para que se tenha uma vida agradável.

A família de Helen tinha um amor muito grande pela garota, porém este amor ao mesmo tempo em que acolhia fazia com que a garota se tornasse agressiva, instável e egoísta, já que não conseguia lidar com o não, outra regra que é aprendida em sociedade: “Não se tem tudo que deseja”. Mas Helen tinha tudo que desejava, e para educá-la Anne precisou tirá-la do seu Ethos para que ela entendesse que haveria de aprender a se relacionar de outra forma, haveria de edificar um eu diferente para obter sucesso em suas relações sociais, pois, ela não enxergava, falava ou ouvia, mas era dotada de necessidades biológicas. E para sanar estas precisava ter ciência de como obter relações sociais bem sucedidas de uma forma mais sociável. E Anne através do tato, olfato e paladar conseguiu ensinar para Helen a soletrar o que foi o primeiro passo para que ela relacionasse nomes a objetos, comportamentos, lugares e pessoas.

Afinal o que faz de nós seres humanos? “Ser humano”, quase um título, como se fosse uma honra ser humano. Capacidade de raciocinar? Viver em sociedade? Capacidade de pensamento lógico matemático? Seria um honra ser humano, se sendo humano eu pudesse dividir tudo isso que é ser humano, e ser humano é aprendido e o aprendizado não é coletivo, ele beneficia algumas classes e detrimento de outras. Desta forma podemos pensar que existem seres mais humanos do que outro, já que uns possuem pensamento lógico matemático mais apurado, não em virtude de diferenças individuais, mas em virtude de oportunidades. Outros conseguem viver melhor em sociedade, afinal tiveram uma educação mais requintada em colégios, famílias e universidades que são selecionadoras, e não selecionam a vontade que cada ser carrega em si, selecionam poder aquisitivo, claro que nem todos são assim. Contudo estes fatos convocam os “seres humanos” a viverem em uma sociedade dividida, enquanto uns freqüentam restaurantes requintados, festas com excesso de comida, vivem em gostosas temperaturas proporcionadas por seus climatizadores e tomam o vinho sagrado outros vivem as beiras do inferno, comendo o pão amassado e jogado no lixo que não foi o diabo quem amassou e sim o seu “semelhante”. E se Helen não tivesse sido educada, teria sido assim mesmo humana?

Gostaria eu que sim.

Qual a importância do tempo para o psicólogo?

Mayara Abreu Resende (Estudante do 2º período de Psicologia da Universidade Federal de Uberlândia – UFU)



Através desse ensaio pretendo discorrer sobre a noção que temos do ‘tempo’, bem como comentar sobre a importância desse conhecimento na prática clínica do psicólogo.

Todas as pessoas possuem dimensões temporais diferentes, sejam elas externas, como a sua idade cronológica, ou internas como as suas vivências pessoais e aquilo que foi apreendido por suas experiências. Com um padrão cronológico específico para cada etapa de vida, o ser humano vai se desenvolvendo. Nas etapas de desenvolvimento - infância, adolescência, idade adulta e velhice, o tempo delineia suas peculiaridades.

Segundo Piaget no comportamento motor da criança, no início da infância, há um padrão de respostas motoras indiferenciadas, e depois, com o desenvolvimento do sistema nervoso central e o crescimento e a maturação biológica, dentro de um intervalo de tempo, há um refinamento progressivo na capacidade de controlar a atividade motora. A criança apresenta, também, uma evolução temporal progressiva em relação ao desenvolvimento cognitivo: período sensório-motor (o bebê utiliza reflexos motores e sensoriais inatos para interagir e acomodar-se ao mundo exterior, tornando-se intencional em suas ações);

Já no período pré-operacional (as crianças começam a pensar simbolicamente, mas não entendem as relações de causa-efeito pelo fato de o pensamento ser pré-lógico); período das operações concretas (as crianças desenvolvem as habilidades conceituais e o pensamento torna-se organizado e lógico) e período das operações formais (o indivíduo pensa em termos abstratos e lida com situações hipotéticas). Na adolescência surgem transformações corporais, psicológicas e sociais profundas, há uma aceleração no desenvolvimento cognitivo e a consolidação da personalidade, um intensivo preparo para a fase adulta. A velhice, outro exemplo de etapa de desenvolvimento, é caracterizada por diversos aspectos de passagem do tempo: tempo físico - relacionado à idade do organismo; tempo biológico - relacionado ao relógio biológico, refletindo modificações no relógio interno, e o tempo psicológico - o mundo como é percebido e vivenciado pelo indivíduo - que enfrenta nova definição de papéis (sentir desvalorização, apatia, insegurança, perda da motivação, isolamento social e solidão).

É de fundamental importância para um psicólogo compreender o tempo de cada indivíduo, seja o tempo vivido objetivamente (cronológico), como o tempo que sentimos ter vivido (subjetivo). Em todos os indivíduos coexistem esses dois tempos, o tempo cronológico - Chrónos e, o tempo subjetivo – Kairós.

Um dos objetivos principais no trabalho do psicólogo comportamental passa pela avaliação e intervenção na modificação de comportamentos que estejam a interferir no bem-estar da pessoa e/ou de quem a rodeia. Se uma pessoa está em sofrimento devido a uma problemática ou acontecimento de vida, a terapia poderá ajudá-la a reencontrar o equilíbrio emocional e a desenvolver um processo de aprendizagem que lhe permite lidar mais facilmente com adversidades futuras.

Para realizar o seu trabalho, o psicólogo baseia-se em alguns pontos fundamentais que possam garantir uma verdadeira relação de ajuda para com o seu paciente, e para que essa interação psicólogo – paciente seja efetiva e produza resultados, o psicólogo precisa compreender seu paciente, e entender que cada um possui em si uma noção de tempo diferente. É preciso que haja consciência e aceitação das diferenças individuais.

O que realmente é tempo? Um dos maiores problemas nas discussões sobre o tempo é o uso rotineiro de sua noção, a qual oculta grandes questões não resolvidas que se escondem, por exemplo, por trás das inquietações do homem sobre sua origem e finitude. As dificuldades de reflexão, as tentativas de definição do tempo, refletem na noção errônea de tempo existente na sociedade.

A noção de tempo normalmente serve para determinar o antes e o depois de processos muito variados, assim os homens têm facilmente a impressão de que o tempo existe, independente de qualquer seqüência de referência que tenha sido socialmente padronizada. O que chamamos de tempo é um elemento comum a uma diversidade de processos específicos que os homens procuram marcar com a ajuda de relógios ou calendários. A padronização social do tempo inscreve-se na consciência individual sólida e profundamente, levando muitas pessoas a ignorar seu tempo individual; esse processo resulta muitas das vezes em problemas psicológicos.

Chrónos: o tempo objetivo. A palavra Chrónos é de origem grega, e significa tempo. Chrónos refere-se ao tempo seqüencial, objetivo, que pode ser medido, contado, aquele que conhecemos o início e o fim. Chrónos é o tempo físico, contado, que guia o mundo em dias, horas, minutos, segundos, anos. É de certa maneira, concreto, homogêneo, contínuo e regular. Na maioria das vezes esse tempo cronológico não coincide com a visão de tempo de cada pessoa. Chrónos exatamente contado e calculado pela ciência através de relógios e calendários, não é o mesmo que as pessoas sentem ocorrer entre um instante e outro. Isso ocorre devido às experiências pessoais do indivíduo. Kairós é o tempo subjetivo. A palavra Kairós é de origem grega, e significa tempo existencial, é a experiência do momento oportuno, o tempo em potencial, tempo eterno. Ao contrário de Chrónos não pode ser medido nem calculado, já que este não possui início nem fim, não tem presente, nem passado, nem futuro. É um momento indeterminado no tempo em que algo especial acontece, a experiência do momento oportuno. É o tempo subjetivo, interno e pessoal, é a noção que cada um tem, é o que sentimos ocorrer entre um instante e outro, independente do tempo cronológico que se passou. Kairós é abstrato, heterogêneo e indefinido. É aquele vivido pelos homens, que na maioria das vezes não coincide com o tempo cronológico, já que as vivências humanas são pessoais, e sentidas de formas diferentes por cada um.

O papel do psicólogo

O papel do psicólogo clínico é auxiliar pessoas que vivenciam problemas que estejam interferindo em seu bem estar psíquico. Para que isso aconteça é necessário que esse profissional acolha a pessoa em todas as suas dimensões e, entre elas, está ‘o tempo’. Após compreender que cada indivíduo possui um tempo particular, no qual suas vivências ganham importância e significado, caberá ao psicólogo auxiliá-lo na compreensão de si mesmo. O psicólogo ajudará a pessoa a compreender melhor a própria subjetividade, buscando no inconsciente os conteúdos que para aquela pessoa tem significado e importância, auxiliando-a para que esses conteúdos sejam compreendidos no mundo objetivo. Esse é o papel dos clínicos que seguem uma abordagem psicanalítica. O psicanalista procura auxiliar seu paciente trazendo situações do Kairós para o Chrónos. Um exemplo pode ser observado em relatos de pessoas que falam sobre coisas que vivenciaram, porém desordenadamente, ou seja, situações que não estão cronologicamente corretas, mas que são importantes para elas.

Considerações finais

Quando uma pessoa é auxiliada na compreensão do seu mundo subjetivo, ela própria passará a criar um novo significado para sua existência, através da compreensão de suas dificuldades e enfrentamento dos seus problemas, diferenciando seu presente, passado, e futuro, acreditando em suas capacidades e administrando, assim, um modo saudável de vida.

Obras consultadas

1- ELIAS, N. Sobre o tempo. Tradução: Vera Ribeiro. Rio de Janeiro: Zahar, 1998. 165 p.

2- Ágora: Estudos em Teoria Psicanalítica - versão impressa - Ágora (Rio J.) v.9 n.2 Rio de Janeiro jul./dez. 2006.

3- Psicologia: ciência e profissão - versão impressa - Psicol. cienc. prof. v.28 n.2 Brasília jun. 2008.

4- Psychê - versão impressa - Psychê v.9 n.15 São Paulo jun. 2005.

5- BION, Wilfred. Os elementos da psicanálise. Rio de Janeiro: Zahar, 1966.