Fernanda Utumi (aluna do 2º período de Psicologia - UFU)
Como nos relacionamos com a temporalidade na nossa vida?
A percepção do tempo está presente em todos nós, independente de época ou cultura. Pretendo discutir como nos relacionamos com ele e como o significamos. Segundo Piettre (Apud BITTENCOURT, 2005, p. 4) o “tempo é conseqüência da marcha inacabada do espírito que anima o mundo” e para Bittencourt (2005, p. 3) “Na perspectiva existencial, o tempo é o horizonte da compreensão do ser.” O tempo segue paralelo às nossas vidas, não é algo concreto, uma coisa em si, mas é quase indissociável de nós. Creio que o tempo está mais para um suceder de tudo mesmo. É muito importante na construção do significado das nossas vidas. As vezes é figura, as vezes fundo. É como uma base para significar os acontecimentos, para entendermos os caminhos que as coisas percorrem para serem algo. É uma base para se ter noção do que já foi, do que é e do que pode ser.
Começamos a ter noção do tempo a partir do momento em que percebemos que as coisas passaram na nossa vida, que o tempo passou, que está passando e continuará a passar, o percebemos porque percebemos que o que era já não é mais. Isso gera uma noção de temporalidade, de seqüência e continuidade. Bittencourt (2005, p. 4) diz que para o indivíduo, no conceito de horizonte existencial existe a interpenetração do passado, presente e futuro. Com relação ao futuro fica uma ambigüidade angustiante, o futuro está por vir, os sonhos e projetos podem se realizar, ou seja, existe a possibilidade ser feliz, porém é o momento que mais se aproxima da morte. Ainda diz que “a esperança, fundada no vigor de ter sido, é a possibilidade de admitir novas saídas para o vivido, agindo na direção de outras possibilidades.”
A noção do tempo como algo que faz deteriorar está mais ligada à nossa finitude e à finitude das coisas, é uma característica nossa e não própria do tempo em si. A religiosidade parece ser uma forma bastante comum de explicar e de consolar o fim inevitável. Existem muitos mitos do qual o tempo é abordado. Vários organizam a vida em ciclos que vão da vida à morte e à vida novamente. Esse ciclo pode ter a função de superar a morte e todo e medo e angústia derivados dela. O teólogo e filósofo alemão Rudolf Otto (Apud RAMOS, 2002, p. 115) fala sobre o numinoso - sentimento único de integração e comunhão com o universo - vivido na experiência religiosa como algo que dá sentido à vida e à morte.
Sobre a dimensão objetiva do tempo e o impacto em nós
O tempo possui duas dimensões: uma como tempo objetivo, o cronológico (Kronos) e o tempo subjetivo (kairós). No âmbito objetivo, o tempo esta relacionado principalmente com as relações de trabalho, produção, lucro (tempo é dinheiro) e também com diversão (aproveite a vida). Nessa perspectiva, o tempo é como um relógio correndo depressa, na qual é preciso aproveitá-lo com o máximo de atividades possíveis, fazendo com que cada minuto seja “usado” ou “aproveitado”. A evolução tecnológica e científica também tem uma relação próxima com a temporalidade: muitos desses avanços são uma tentativa de fazer o tempo “andar mais devagar”, evitar os sinais do tempo, prolongar a vida. O interessante é o contraste dessa relação, por um lado o tempo, impassível, e por outro nós, armados de toda tecnologia existente contra os seus danos.
Acredito ser muito importante o interesse em aperfeiçoar as técnicas de ação sobre o mundo, significa também avanço no conhecimento. O problemas está nas concepções objetivantes do tempo. Nosso estilo de vida não estimula a compreensão do sentido da vida, somos a todo tempo orientados a produzir e produzir, mas o que acontecerá quando não produzirmos mais? “A chave para a questão da morte abre a porta da vida.” (KÜBLER- ROSS, 1975 APUD PAPALIA, OLDS & FELDMAN, 2006, p. 739)
A vida quando pensada com algo que a dê sentido, seja qual for a explicação, se torna mais tranqüila, aceitamos que o fim faça parte de algo que não entendemos, e que nele tem um motivo. Assim passamos a aceitar mais e viver com mais intensidade, com mais compreensão e menos vazio e desespero.
REFERÊNCIAS
BITTENCOURT, Maria Inês Garcia de Freitas. Reflexões sobre o tempo: instrumentos para uma viagem pelo ciclo vital. Psychê, São Paulo, v. , n. , p.93-104, jun. 2005. Disponível em:
DAMASCENO, Alexandre Vinícius Campos, GOMES, Roseane Côrrea. Na medida certa. Departamento de Matemática, Ananindeua, Belém, PA. Disponível em:
PAPALIA, Diane E.; OLDS, Sally Wendkos; FELDMAN, Ruth Duskin. Desenvolvimento Humano. 8ªed São Paulo: Artmed, 2006.
RAMOS, Luís Marcelo Alves. Apontamentos sobre a psicologia analítica de Carl Gustav Jung. Educação Temática Digital, Campinas, v.4, n.1 –, 2002. 110-144 p.