Desde que a professora Analú explicou como queria o trabalho teórico da disciplina, o qual consistiria basicamente em escolher qualquer assunto, filme, música, poema, o que a pessoa quisesse para analisar aquilo a partir da fenomenologia, fiquei pensando no que poderia fazer mas achei extremamente difícil pois eu estava, e ainda estou, tendo bastante dificuldade em ver as coisas numa postura fenomenológica. Mas penso que isto deve ser algo que requer muito treino e que eu não desenvolveria isso tão rapidamente, então aqui farei somente um ensaio de como poderia ser o pensar fenomenologicamente.
Na penúltima semana de aula então comentei com a professora que queria fazer sobre algum filme, mas não tinha conseguido pensar em algum e então ela me sugeriu o filme “O diabo veste Prada”, o que achei interessante por ser um filme recente que eu já tinha vontade de assistir, pois não gosto muito de filmes alternativos ou europeus, parece que a professora adivinhou meu gosto ao sugeri-lo.
Antes de ir à locadora dei uma revisada em alguns sites sobre fenomenologia, para que quando eu o assistisse soubesse um pouco qual olhar eu deveria ter e se eu poderia fazer alguma mínima relação do que lesse com o que eu assistisse.
Aluguei o filme e fui para a casa da Fernanda, a minha melhor amiga, para assistir com ela, afinal acho um pouco triste assistir um filme sozinha, mesmo que seja para fazer um trabalho sobre ele. Começamos a assistir e eu já tinha uma idéia de que seria algo sobre moda pelo “veste Prada” do nome, mas a história é basicamente a de uma jovem, Andrea, a qual se muda para Nova York a fim de tentar uma carreira como jornalista, então consegue um emprego na maior revista de moda da cidade, como assistente da poderosa editora-chefe Miranda Priestly, mas tem sérios problemas com as exigências absurdas de sua chefe.
Logo no inicio do filme, me chamou a atenção a primeira cena em que as várias personagens que serão conhecidas ao longo da estória estão se vestindo para irem trabalhar, e nesse momento já se verifica um contraste fortíssimo entre a forma como Andrea se veste mal perto das outras, o que é enfatizado por todos os funcionários da empresa que quando vêem Andrea ficam horrorizados com a forma como ela se veste inadequadamente. Dessa inadequação eu vi um pouco de como eu me senti quando entrei no curso de Psicologia, pois eu estava acostumada com o ambiente de colegial e com minha turminha e enfrentar todo aquele ambiente me fez sentir “um peixe fora d’água”, até falei sobre isso em algumas dinâmicas de apresentação nas disciplinas, acredito que eu não estava preparada para aquela mudança e principalmente para entrar em uma universidade e num curso os quais nunca foram o meu sonho como a maioria dos meus colegas.
O filme mostra que Miranda faz o tempo todo pedidos absurdos a Andrea e se ela não os cumpre da exata forma que Miranda quer tudo vai por água abaixo, todos na empresa têm de agir da forma que ela quer pois ela é a peça principal da revista e portanto meio que “manda” em todos. Não sei se seria muito certo eu fazer essa associação, até porque ela é muito pessoal, mas essa característica de Miranda me lembrou o meu pai, pois quando eu me relaciono com ele parece q tudo é condicional, a qualquer palavra errada que eu fale ou coisa errada que faça ele pára de conversar comigo e fala que não gosto mais dele, isso me gera bastante angústia como eu vejo nos personagens do filme, é como andar na corda bamba a todo momento. A própria Andrea se angustia com essa situação, pois fala em mais de um momento que o que mais queria era que Miranda reconhecesse o bom trabalho que ela fez, e isso não acontece, até como não acontece muito na minha vida, já que minha mãe quando eu passo no vestibular ou tenho outra conquista somente diz que não fiz mais que minha obrigação.
Principalmente no inicio da estória é mostrada muito a relação que Andrea tem com o namorado e os amigos, nas conversas todos enfatizam que estão em empregos que não são dos sonhos mas que pagam o aluguel, ela mesma o tempo todo fala mal de Miranda e dos funcionários, para ela aquilo é muito fútil e pensa que para fazer um bom trabalho não precisa se tornar igual a eles, o que posteriormente ela percebe que não é bem assim, pois depois de penar muito percebe que teria mais credibilidade na empresa somente quando se adequasse ao visual dos outros. Isso eu vivenciei muito na faculdade mas é muito comum também se ver isso na escola, onde quando você não se veste ou pensa igual aos outros é excluído e até maltratado, e muita gente cede a essa pressão se igualando então à massa, penso que é um pouco necessário para que sejamos aceitos e fiz isso quando entrei no curso porque eu costumava ser um pouco “revoltada”, sempre gostei de agir diferentemente dos outros, ter cabelo diferente, usar maquiagens fortes e roupas escuras mas quanto mais velha fui ficando percebi que não poderia levar isso adiante buscando ser uma futura psicóloga, então mudei um pouco meus trajes a atitudes, todos inclusive comentaram que eu “melhorei” bastante ao longo do curso, mas sinto que aquele lado rebelde meu ainda está guardado mas hoje se manifesta nas situações e com as pessoas adequadas, e não em todos os momentos. Acho que isso se mostra ao longo do filme também porque Andrea com os amigos se mantém a mesma em quase toda a história, é o momento em que ela é ela mesma e não é julgada por roupas que veste ou por suas idéias não serem as mesmas que as de todos, sendo julgada somente quando ela se afastou do que sempre foi e começou a de fato ser mais uma das pessoas do mundo da moda.
À medida que ela vai conhecendo Miranda, vai deixando de odiá-la e criando uma relação muito forte, e acaba por viver em função dela e sacrificar seus relacionamentos fora do trabalho, com namorado, amigos e família, e a própria Miranda por gastar todo o tempo trabalhando mal passa tempo com suas filhas gêmeas e seu marido, o qual resolve se divorciar dela por isso. No filme isto me mobilizou uma certa tristeza pois vejo hoje em dia muitas pessoas que vivem em função do trabalho e perdem o amor do parceiro, o crescer dos filhos, e tantas coisas pequenas e lindas que se passam fora dessa correria do trabalho mas que são muito importantes para qualquer ser humano ser verdadeiramente feliz, o que fato aconteceu um pouco na minha casa, pois minha mãe é médica e por amar tanto o trabalho e querer fazê-lo bem feito, acabou por sacrificar muitos momentos que ela poderia ter passado do nosso lado e eu e meu irmão acabamos por ser criados pela empregada, que trabalha na minha casa desde a nossa infância e inclusive chamamos de tia, sinto muita falta dessa figura maternal e penso que buscarei fazer diferente quando tiver o meu trabalho.
Ao mesmo tempo, trabalhando com moda parece que ela vai se encontrando, parece que ela realmente descobre um lado que gosta daquelas coisas e se sente feliz trabalhando com aquilo, mas nem seu namorado ou seus amigos entendem isso, pensam que ela está fugindo do que ela é, e o filme passa realmente essa imagem de que o tempo em que ela se identificou com aquilo ela não estava sendo ela mesma, mas não concordo pois penso que ela se encontrou naquele ramo e gostava do que fazia, só não podia deixá-lo corromper sua integridade como acontece em alguns momentos e como aconteceu com Miranda, que passa por cima de pessoas que gosta para se manter no ramo e garantir seus interesses. Quando pensei sobre como o filme mostra esse “se encontrar”, fiquei triste pois no final do filme Andrea sacrificou todo este novo ser dela porque Miranda disse a ela que via muito de si nela, e isso a fez desistir pois Miranda era uma pessoa com a qual ela não queria parecer nunca. Para mim ela poderia muito bem continuar seguindo esta nova vocação sem se deixar levar corromper pelo meio, ela já havia se tornado outra pessoa que não poderia simplesmente esquecer aquilo tudo e voltar a ser jornalista, já não fazia muito sentido mas o filme termina desta forma, dando a entender que aquela experiência na revista de moda somente serviu como aprendizado mas devia ser deixada para trás. Ao pensar este “se encontrar” na minha vida, vejo que quando entrei no curso de Psicologia eu não tinha aquilo como sonho e não me interessava tanto, já que sempre pensei em fazer outro curso, mas acabei por descobrir ali uma vocação, e acredito hoje que serei uma boa psicóloga e fiz uma boa escolha, mesmo que ainda tenha no fundo um desejo de ser estilista.
Em alguns momentos do filme, como quando Andrea aceita ir para Paris no lugar da outra assistente mesmo ela sendo sua amiga e sabendo que ela queria muito ir, ou quando falta no aniversário do namorado para atender a caprichos da chefe, ela age de má fé e fugindo da responsabilidade por suas escolhas julga-se uma vítima das circunstâncias, dessa forma ela pode eliminar toda angustia gerada pela consciência da liberdade de escolha. O mais interessante é que no momento em que a chefe fala claramente para Andrea que ela ‘tem sim’ escolha, ela assume a sua responsabilidade e o controle sobre a sua vida. Esta angústia é muito forte para mim em todos os momentos, às vezes eu gostaria de me sentir como se não tivesse escolha, mas diferentemente de Andrea, sinto como se quase tudo dependesse do que eu escolho e essa liberdade me desespera pelo que eu posso estar perdendo se fizer escolhas erradas, mas tenho consciência de que por mais que a vida seja feita de escolhas, ainda vou errar bastante para que consiga fazer algumas escolhas certas.
Por fim, o que mais me marcou no filme foi a amizade “estranha” que se estabelece entre Andrea e Miranda, e mais ainda, a cena em que Andrea entra no quarto de hotel e se depara com Miranda chorando toda sem maquiagem e mal arrumada, a qual se encontrava assim porque seu ultimo marido, como os outros também estava pedindo o divorcio, e ela manifesta uma preocupação com a falta de figura paterna para as filhas. Acredito que o mesmo desconcerto em que ficou Andrea eu também fiquei, mas também fiquei encantada, pois ao longo do filme fico incomodada, pois sei que Miranda possui um lado humano, mas este não é mostrado hora nenhuma, e nesse momento isso se evidencia de uma forma muito forte, o que me deixou encantada, mas ao mesmo tempo, no resto do filme ela volta a ser fria e isto me deixou muito triste, pois eu realmente queria que ela passasse a viver sua vida de forma diferente, eu senti muita pena e indignação de nada mudar, pois senti a dor dela no momento em que ela se mostra fraca, fiquei somente pensando como deve ser viver a vida toda daquela forma, esta personagem me mobilizou sentimentos muito fortes.
Assim, este filme para mim foi bastante rico para refletir sobre vários aspectos da minha vida, e conhecê-lo sob este ponto de vista de considerar minha subjetividade para mim foi bastante rico e fiquei bastante satisfeita com os resultados. Porém o que achei mais curioso e realmente fiquei impressionada foi como a professora me indicou um filme que se passa em uma revista de moda, pois desde criança meu sonho é fazer o curso de Moda, sempre quis ser estilista e desde os 10 anos desenho modelos com roupas que eu mesma criava, até minhas roupas das formaturas da oitava serie e terceiro colegial foram desenhadas por mim, até o tecido eu escolhi e elas ficaram lindas. Pode ter sido coincidência a professora ter indicado esse filme, mas o que digo é que ele mexeu muito comigo desde o inicio, pois reviveu este sonho meu que estava adormecido desde que entrei no curso de Psicologia, o que fiz por não ter condições de pagar um curso de Moda em uma universidade particular, e a partir de agora passei a repensar o que farei do meu futuro, e por mais que eu vá exercer a minha profissão de psicóloga ainda quero fazer o curso de Moda e talvez um dia seguir meu sonho de criança de me tornar uma estilista e talvez até trabalhar em Paris...
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